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Tramontina



Para ler ouvindo Look at you, de Screamings
vermelho Trees.






Tramontina estava no chão havia dias, imóvel e coberta de sangue. Se tivesse pensamento, perguntaria
vermelhoa si mesma como tinha ido parar ali, naquele canto do quarto, junto ao pó do carpete. Algumasvermelhovermelho formigas passavam por cima dela, ao redor, indo e voltando. Quando a encontrariam?

Antes de tudo acontecer, ela passava o tempo todo com
vermelhovermelhovermelho suas irmãs no faqueiro da cozinha. Mal saía de sua fenda: vermelhocomo tinha sido feita para cortar carne, só era utilizada nos raros domingos em que Vera e Peter recebiam visitas para o almoço. Eles são vegetarianos. São vermelhovermelhoou eram?vermelho Eram. O sangue mais recente era o de Vera, coagulado em Tramontina e azedado pela mistura de resto suor e vermelhovermelhovermelhodesodorante ressecado.

Havia pouca área limpa na lâmina, de forma que, quando a porta se
vermelhovermelho abriu, ela quase não refletiu a luz que invadiu o quarto. Não levou tempo para que uma mão vestindo luva de látex a apanhasse reverentemente e a guardasse numa sacola plástica.vermelhovermelho Houve conversa, vai e vem, e levaram ela para fora do apartamento. Passeou de carro pela primeira vez desde o dia em que tinha sido comprada. Por fim, foi deixada numa cozinha um poucovermelho diferente.

- Vejam, ela se debateu. Olhem aqui as marcas de defesa. A de cujus estava acordada, lutou pela vida. Por isso os cortes
vermelhoirregulares. A faca de carne é um instrumento cortante. Reparem como a pele abre suavemente com a incisão do bisturi. Estão vendo? Agora, Djalma, me passe o instrumento. Isso. Veem o que digo?

Tramontina nunca tinha cortado nada suavemente. Não foi diferente com Vera. Seu vermelho ainda coloria a faca, como uma memória
vermelhovermelhovermelhovermelho suja da qual não se lava. De Peter, não havia marcas. Como se diz, a última impressão é a que fica. No caso, a vida de Vera e a morte de Vera: só ela usava a faca. Peter não sabia cozinhar, vermelhoapenas comer.

Não se reuniria novamente com as irmãs, mas também não sabia disso. Sem que sequer a lavassem,
vermelhovermelho Tramontina passou a ser guardada dentro de uma gaveta funda junto com uma papelada que ocasionalmente alguém consultava. É difícil saber exatamente por quanto tempo, pois não havia vermelhorelógio lá dentro, mas pareceu muito. vermelhovermelhovermelhoA cada vez que os papéis voltavam de uma ou outro manuseio, eles tinham mais cheiro e manchasvermelho de café. Se tivesse sentimentos, Tramontina sentiria saudades. Na casa de Vera e vermelhoPeter, todos os utensílios eram lavados antes de serem guardados. Fosse quem fosse que a tinha adotado, não estava sendo bom pai vermelhoou mãe.

Inadvertidamente, num dia qualquer, todo o material da gaveta foi levado de carro a uma grande
vermelhovermelhosala, cafona, onde havia conversa - ou, antes, discussão, e uso vermelhoexagerado de proparoxítonas.

- Senhoras e senhores, por fim, peço atenção ao conclusivíssimo resultado do exame de fezes. Não há como negar que este sujeito é culpado dos
vermelhogravíssimos crimes cometidos. Obrigado.

- Senhores, digníssimos membros do júri, não se esqueçam que não há testemunhas, não há impressões digitais. Não há
vermelhonada.vermelhovermelho Meu cliente tem um álibi. O ilustríssimo promotor insiste no exame de fezes, mas, tem termos de prova, com todo respeito, é uma prova de merda.

- ORDEM! ORDEM NO TRIBUNAL!

Se tivesse personalidade jurídica, teria testemunhado. Mas, para isso, também precisaria ter memória. Depois do
vermelhovermelho circo, Tramontina voltou para o escuro por mais um tempo indeterminado - e nada de detergente. Até que:

- Olha só, o que temos aqui?
- Deve ser de algum
vermelho caso velho. Prova material.
- Porra, beleza de faca. Vou levar pra casa.
- Vai que usam ainda no processo, deixa aí.
- Que é isso,
vermelhovermelhovermelho Bezerra? Tu não ficou sabendo? Apagaram o caravermelho na cadeia.
- Que cara?
- Não tá vendo aqui, é daquele caso, daquele casal. Lembra? Os vegetarianos.
- Ah, sim, to lembrado. Puta merda. Mataram o cara então?
-
vermelhovermelhovermelhovermelhovermelhoMataram.
- Cara doido. Dois vegetarianos. Ninguém imagina, né? E podia ter sido o crime perfeito. Se não fosse aquela cagada...
- Haha.
vermelhoBoa. Foi mesmo. Uma crueldade. Mas depois da manchete do Diário, o cara se fudeu. Merecido.
- Manchete? Não to
vermelhovermelholembrado.
- Era mais ou menos assim: “Picadinho de esposa causa indigestão no marido”.
- Ha! Que filhos da puta! Tiveram a manha.
- Pois é. O povo quis
vermelhosangue e teve. A vingança dos caras não foi menos violenta.
- No xilindró?
- É.
- Fizeram picadinho
vermelhovermelho com ele, aposto.
- Ô, se fizeram. Falando nisso, agora deixa comigo a facona que essa é das boas. Essa tem história. E eu to a fim de assar uma carne no sábado. É só
vermelholavar que tá novinha. Tu leva a cerveja?







Por Thiago F. * 21:13 * domingo, 31 de julho de 2011